Biblioteca Convida: Maria Bitarello


Bate-papo sobre meu último livro, “Vermelho-terra”, a convite da Biblioteca Comunitária Caio Fernando Abreu, da Casa 1 – o centro de cultura e acolhimento de pessoas LGBT, no Bixiga, em São Paulo (2021). É só clicar pra dar play ou abrir aqui pelo perfil da @casa1 no Instagram.

Pré-venda de VERMELHO-TERRA

Já passamos da metade da campanha de financiamento coletivo para a publicação do meu novo livro, Vermelho-terra! Para participar, visite nossa Benfeitoria, escolha sua recompensa e faça uma colaboração! O livro – ou os livros – chegarão via correios até você, com dedicatória e tudo, assim que tudo estiver pronto, em julho!

Essa campanha viabiliza a publicação do livro que traz textos e fotos a partir de uma viagem a campo feita a Ketu, no Benim, e funciona também como pré-venda, pois não será possível a realização de um lançamento presencial, diante da realidade imposta pelo isolamento social.

Então fica aqui o convite pra você conhecer o projeto!

Assista ao vídeo, mande para os amigos e espíritos afins e se junte a nós nessa empreitada pela sobrevivência da cultura brasileira em tempos de caos!

Axé!

Amor!

Humor!

Dois escritos para voltar ao Sertão

É com muito prazer que anuncio os dois novos lançamentos de La Petite Ferme, editora caseira de guerrilha nascida em 2014.

Livro em formato impresso, versão pocket, com projeto gráfico da autora.

Lançamento dos dois livros de Lia Rezende Domingues no dia 19 de dezembro de 2020: Minha vida com Tê: estudos genealógicos e Abro-te meus caminhos: contos-diários do meu primeiro sertão da caatinga.

Livro em formato digital + audiobook, com produção musical de Igor Visentin.

Sobre os livros:

Edição:
Maria Bitarello
Consultoria editorial: Ulisses Belleigoli
Revisão: Paula Martins Costa
Projeto Gráfico: Lia Rezende Domingues
Produção Musical do audiobook:
Igor Visentin
Voz: Lia Rezende Domingues
Editora: La Petite Ferme

Lia Rezende Domingues, autora dos livros (Foto: Maria Gabriela Matos)

Lia Rezende Domingues é jornalista (Universidade Federal de Juiz de Fora) e designer ecológica (Gaia Education). Trabalhou com comunidades tradicionais, economia popular solidária, a Embrapa e o ICMBio. Peregrina dos sertões, escreve desde pequena. Abro-te meus caminhos: contos-diários do meu primeiro sertão da caatinga e Minha vida com Tê: estudos genealógicos são seus dois primeiros livros.

“O tempo das coisas”: lançamento em JF e SP

Quando você vai preparar um chá, tem o tempo de fervura da água, o momento da infusão, a espera pelo resfriamento e só então a ingestão da bebida. Não dá pra mudar a ordem dos fatores nem o tempo que cada um deles demanda. A água só vai ferver a 100 graus C, a erva precisa de alguns minutinhos na água quente pra ser infundida e se você não esperar esfriar vai queimar a língua. As coisas têm seu tempo. E embora os tempos hoje sejam de afobação, o chá ainda toma o tempo que toma pra ficar pronto. E tudo indica que vai continuar sendo assim. Saber disso, no corpo e na alma, é o que eu chamo de sabedoria.

 

Reflexões sobre o tempo são sempre bem-vindas. E também sobre a vida, cujas melhores coisas não são as coisas, propriamente ditas. A tecnologia, a correria, os olhos no relógio, os ouvidos tapados por fones nos isolam de um convívio mais próximo com o outro e de um olhar mais apurado. Não há tempo para parar, olhar e sentir.

Esse tempo que nos falta, no entanto, Maria Bitarello, felizmente o tem. Fabricou-o, optou por ele, priorizou-o e o fez virar livro, para o nosso deleite e transformação. Sim, porque será impossível não sair ao menos minimamente transformado da leitura de O tempo das coisas, sua segunda coletânea de crônicas e primeira a ser lançada pela In Media Res Editora.

São 28 textos que falam de situações banais, cotidianas e de como elas ganham importância quando recebem a devida atenção.

É impecável a reflexão da autora sobre a vida noturna, considerada por ela um ritual de iniciação à vida. E sua percepção sobre o quanto um dedo mindinho quebrado pode atrapalhar nossa rotina numa proporção inimaginável, ao mesmo tempo em que o desprender-se das coisas pode tornar nossos dias bem mais leves.

Numa parada para olhar o entorno, Maria vê que há tanta riqueza filosófica nos escritos de Nietzsche quanto na moradora de rua que se banha na Av. Paulista. E que fotografar, comer o que se quer e resistir ao uso desenfreado dos smartphones podem ser ações libertadoras. Há o envelhecimento, o aborto e a morte vistos e falados com seriedade e serenidade. E o tempo, o grande tesouro dos nossos dias. O tempo que não pode ser abreviado por ser necessário, por significar processo. O tempo da fervura da água e da infusão do chá. O tempo da parada, do olhar, da escrita e da leitura com que Maria generosamente nos brinda.

Confirme sua presença no facebook.

 

Maria Bitarello é mineira. Formada em Jornalismo pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e mestre em Literatura Luso-Brasileira pela Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), cresceu entre o Brasil e os Estados Unidos e viveu em Paris antes de se estabelecer em São Paulo, em 2012. É escritora, tradutora e jornalista e, desde 2015, trabalha no Teatro Oficina.

 

Ilustração da capa: Praça Roosevelt, by Letícia Coura

O que eu (não) sei sobre Ulisses

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Nunca li Ulisses. Confesso que nem tenho vontade. Tampouco li Ilíada, nem Odisseia. Não sei muito sobre esses personagens que partilham o nome Ulisses. Mas batizada, eu também, com um nome que carrega histórias e personagens – Maria, há tantas –, entendi logo o fardo que carregava aquele garoto de 18 anos que conheci na faculdade. Talvez os nomes tenham sido o primeiro passo em nossa dança de aproximação e amizade. Será que se tivéssemos outros nomes seríamos amigos há 15 anos? Não saberemos, mas fica aberto o espaço à divagação, à fantasia, caldo e alimento do escritor – nosso ofício, meu e dele – e amálgama da maioria das nossas conversas ao longo dos anos. E, eu viria a saber mais pra frente, os nomes, na vida e na obra do Ulisses, jamais prescindem de valor e subtexto.

Em nossos primeiros meses de convivência e alto potencial de aproximação feliz, Ulisses me fez uma proposta e um convite que eu aceitei: confiou, a mim, um segredo. Eu não sabia na época, mas confiar a alguém algo seu, algo íntimo, é a maneira mais certa de ganhar sua lealdade. Guardei-o comigo, com mais zelo do que se fosse meu. Ulisses, que é muito mais inteligente do que eu, um mestre das paixões humanas, já sabia que eu o guardaria. E viramos amigos. Irmãos. Confidentes. Parceiros. Almas gêmeas. E, anos mais tarde, também colegas de o(fí)cio. Minha trajetória de escritora é intrinsicamente ligada e indissociável de minha amizade com Ulisses. Ele encadernou, organizou, prefaciou, revisou e editou meus primeiros textos, todos eles. Montou-os em edições caseiras, me mostrou que eu já escrevia, que o ofício já estava lá. E quando meu livro nasceu, foi ele quem fez o parto.

Não há orgulho em ser assim. Escritor. Há conformação. Durante os anos, me lembro de não poucos momentos em que decidimos, ambos, parar de escrever. Hoje rio sozinha lembrando disso. Não éramos acometidos ao mesmo tempo por esse mal estar, ainda bem. Quando um ficava estremecido, o outro estava ali pra dar uma escorada. Sempre tivemos uma facilidade muito evidente pra entrar em conversas de cunho estritamente estético. E a velocidade com que passamos a embarcar nessa tangente de assuntos foi se aprimorando com o tempo. Já há 8 anos não residimos na mesma cidade; metade desse tempo, sequer no mesmo país. Fomos afiando nossa navalha da intimidade argumentativa nas janelas de oportunidade que apareciam. Revelações íntimas e detalhadas foram compartilhadas em trajetos de 20 minutos, da rodoviária à casa, algumas dezenas de vezes. Conversas ao portão. Sentados no meio fio. Deitados à tarde, olhando pro teto, ignorando as chamadas (de celular) do mundo lá fora, externo a nossa bolha e, portanto, fora de nossa prioridade (e sobretudo de nosso interesse).

Somos muito diferentes, porém estranhamente complementares. Não brigamos, embora discordemos com frequência. Respeitamos o sono e as vontades do outro. Passamos horas em silêncio confortável. Dançamos. Cantamos. Comemos. Lemos juntos. E rimos muito, sempre. Geramos ciúmes, com certeza, mas prefiro acreditar que incitamos ainda mais admiração. Afinal, amizades como a nossa são pequenos tesouros, e não sobrevivem por vontade divina. Perduram e resistem por uma mistura de cuidado, carinho e respeito de ambas as partes. E também por um certo elemento, imprescindível, de ausência de esforço. A palavra em inglês é effortless. O que sempre nos ajudou, indiretamente, a não cair no drama. Juntos fomos tentando, e na maior parte do tempo conseguindo, transitar da tragédia à comédia sem escala pelo drama. No fim, a diferença entre as duas é apenas temporal. Passado certo tempo, toda tragédia vira comédia. E Ulisses domina, com maestria, esse timing. Ninguém o ensinou isso. Veio com ele. Suspeito que herdado da mãe.

Feito esse preâmbulo, volto-me a Homo Sapiens Erectus. Esse é o décimo livro do Ulisses. Eu o li, e todos os anteriores também, no manuscrito, na versão caseira, rascunhada, aquela que a gente nunca vê dos nossos autores favoritos. Esquecemos de nos lembrar que todo mundo tem rascunhos. E nossos rascunhos, acredite, não são a obra. São o zigoto de uma ideia. Portanto, quando alguém te confia um manuscrito de um livro, aceite-o com pompas. Se não for pra honrá-lo, recuse-o de uma vez. Porque ali está um pedacinho da alma do escritor que lhe é entregue em mãos, encadernada. Tenha em mente que ele pode, sim, valer mais que um segredo. Ser mais íntimo. E essa aposta, esse convite do Ulisses, eu também aceitei. Com gratidão e humildade. Miigwech.

A primeira vez que tive contato com os contos que compõem esse volume já faz 5 anos. Eu morava na França, e o manuscrito que até hoje eu guardo, com meus rabiscos e impressões, me foi enviado por correio. Eu e Ulisses fomos capazes de manter nossa comunicação fraterna e editorial através dessas distâncias transatlânticas, e Homo Sapiens Erectus foi um desses projetos epistolares. Suspeito até que a distância tornou nosso diálogo literário ainda mais rico, como se através da arte, da literatura, nosso amor e vontade de partilhar fossem transmitidos com mais precisão. Direto ao coração. Me dedicava a essas atividades com o afinco de uma apaixonada. De corpo e alma presentes, sentia que o espaço-tempo coincidia. Isso nos manteve ligados com um arco muito mais teso que conversas ao telefone, que raríssimas vezes tivemos. Há muitos anos já havia desistido de conversar ao telefone com o Ulisses. Aprendi cedo que ali não dava jogo. Ele é lacônico e esquisito de fone ao ouvido.

O que vocês têm em mãos, portanto, caro leitor, esse compêndio de histórias e fantasias, é um exercício da vontade, da paciência e da teimosia do autor. São contos que ele vinha escrevendo há mais de 15 anos, desde a adolescência, e cuja publicação vem sendo gestada há mais de cinco. Fantasias vividas, idealizadas, escondidas, teatralizadas, sublimadas, mas nunca ignoradas. Há o belo, o fetiche, o perverso, o infantil. Fantasias que dão tesão, outras que dão medo, e até culpa. E a catarse da escrita, ele aprendeu cedo, cura. Recria. Funciona tanto que há autores que deixem de viver fora do livro, tamanha a satisfação advinda da imersão.

Já contei em uma crônica minha que o método de criação desse meu amigo me intriga. Essa sua forma de processar as ideias, encontrando-as e organizando-as em sua cabeça antes de escrever uma linha sequer. Ele tem um caderninho. Mas as palavras ali não abundam. Às vezes, toda a gênese de um romance – que ele sabe do início ao fim, diálogos inclusos – está contida em uma única palavra, em letras estilizadas e garrafais, com rabiscos circundantes. Tipo um desenho que se faz na última folha do caderno de escola, onde a gente deixa o inconsciente (e o tédio) fluir enquanto fracassamos em prestar atenção na aula. E, pensando bem, é por aí mesmo que a criatividade do Ulisses opera. Como nossa amizade. No acaso distraído. Na atenção flutuante. Na vigília agitada e no sono vespertino.

Um professor meu, no mestrado em literatura, me explicou em aula a diferença entre o autor, o narrador e a voz narrativa. Às vezes, a voz narrativa é a voz do narrador. Outras não. Às vezes, o leitor sabe apenas o que o narrador sabe, outras sabe mais que ele. E de vez em quando, mas com muito menor frequência, o narrador, a voz narrativa e o autor são o mesmo. E mesmo nesses casos, nunca são exatamente o mesmo. Porque até contando a “verdade”, mentimos. E o livro confessional também é uma ficção. O Ulisses gosta da mentira. Regozija-se dela. Refestela-se. Pratica-a em muitos lugares, em muitos tempos. O que não tem nada a ver com falta de honestidade. Aliás, muito pelo contrário – e me aproveito de uma ideia de Dostoyevsky, em Crime e Castigo: é de mentira em mentira que se chega à tal verdade. E Ulisses, que é analista, escritor, professor e contador de histórias, sabe muito bem disso. Acho até que é por isso que ganha a vida contando e ouvindo histórias.

Ofereço aqui, portanto, uma nota de advertência de uma velha marinheira desses mares de Homero: duvide, sempre, do Ulisses, mas não de seus narradores. Aqui, nesse volume, você vai encontrar muitos deles. Cada hora um. Nenhum deles é o autor. Nenhum. Portanto, guarde suas ressalvas para o homem que gerou tantos outros homens e tem horror a ser levado a sério. Se encontrá-lo na rua, no bar, no cinema, desconfie, provoque, cutuque-o. E guarde sua confiança para a duração que tiver sua travessia por essas páginas. O narrador é coisa séria. E aqui, autor, narrador e voz narrativas só se cruzam nas nossas interpretações, nas concatenações do leitor.

Ulisses, caprichoso, me confessou muito cedo ter uma fantasia das mais picantes: sonhava em, um dia, não criar mais histórias em sua cabeça. Aspirava viver uma vida onde as experiências e as fantasias não se transformam em personagens e eventos. Esse, e não tudo que você vai ler nesse livro, foi seu maior fetiche. Não sei se perdura, porque as fantasias também se gastam e desgastam. Afinal, percebemos, com o passar dos anos, que maior covardia não é a vida de escritor – esse ser solitário e esquisito que vive em seu cubículo imaginário, acompanhado de palavras, monstros, sonhos e vaidades. A maior covardia é não escrever. E, em seguida, não publicar. A gente se vê descobre no que escreve. A gente publica pra não viver rodeado de fantasmas e de rascunhos inacabados.

Dito tudo isso, você deve estar se perguntando o que eu não sei sobre o Ulisses. E eu arrisco dizer: mais coisas do que eu suponho. Ulisses preserva mistérios e cultiva segredos. Mas a partir de agora, caro leitor, esse livro que você tem em mãos não é mais um deles. Honre-o.

Prefácio escrito para o livro Homo Sapiens Erectusde Ulisses Belleigoli.

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